domingo, 17 de julho de 2011

Idade Média: Nem tão honrada ou das Trevas assim...
























Como historiador e professor de história costumo me deparar constantemente com aquela vontade muito chata de desconstruir idéias pré-concebidas sobre alguns temas e períodos da história, ainda mais quando alguns amigos cultuam tais idéias vinculadas em filmes, livros e outras mídias.

Certamente que a Idade Média é um destes assuntos falados, descritos e comentados entre jovens que comumente jogam RPGs, games de PC e videogame, ou mesmo que escutam bandas de Heavy Metal, assistem a filmes de fantasia e degustam enlouquecidamente obras da literatura universal sobre o tema, desde os romances históricos de Bernard Cornwell ou mesmo mais fantasiosos ao estilo da tão cultuada trilogia, "Os Senhor dos Anéis", de J R.R. Tolkien.

Lembro de uma conversa informal sobre a Idade Média com amigos há alguns anos, quando manifestações saudosistas foram desferidas em torno da guerra honrada medieval, da "peleia" olho no olho entre cavaleiros habilidosos no campo de batalha, muito diferente da guerra moderna, em que "o apertar" de um simples botão colocaria fim a um combate sem nem sequer haver troca de golpes entre os adversários de uma contenda.

O problema destas posições é que indiretamente demarcam uma construção um tanto fantasiosa sobre a guerra na Idade Média, desconsiderando que as batalhas eram muitas vezes lentas e sem quaisquer técnicas sofisticadas de combate corpo a corpo, na maioria das vezes empreendidas por armamentos de cerco, sem contato direto entre os adversários, com uma minoria de nobres suseranos e vassalos vergando armaduras pesadas e enferrujadas a ordenar do alto de seus cavalos uma maioria de servos ou vilões esfomeados, munidos apenas de ferramentas simples ou armamentos encontrados pelos campos afora, sequer armadurados ou descansados.

Nas palavras da historiadora Fátima Regina Fernandes, "camponeses que nem sequer dispunham de armamento, condições ou preparo militar para quaisquer batalhas", somente a vontade de agradar seus senhores ou mesmo à Igreja Romana, que quando não incentivava a Guerra Santa contra povos considerados infiéis, tentava ordenar os conflitos por meio de torneios de justa e espada, em uma espécie de código de diplomacia utilizado para conter o ímpeto guerreiro de uma elite estamental que vivia do saque ou dos rituais de vassalagem para a aquisição de novos feudos para governar.

Também não quero, com tais posições, defender as teses Iluministas de Voltaire e outros sobre uma Idade Média das Trevas, destituída de razão, embebida pela fé cega, pela intolerância e na mais absoluta ignorância. Os importantes trabalhos de Jacques Lê Goff, talvez o mais reconhecido medievalista vivo, ou mesmo as obras de Marc Bloch e seus "Reis Taumaturgos", já demonstraram o quanto a visão negativa sobre o período feudal não possuem qualquer sustentação, visto que muitas tecnologias e conquistas foram desta época histórica.

Hoje sabemos que a vida cotidiana nas cidades medievais não era somente permeada por doenças, trabalhos forçados e procissões de fanáticos religiosos, sobrando espaço sim para a diversão em meio as famosas feiras e trocas comerciais do porte daquelas encontradas em Flandres ou na Rota da Champagne francesa, até mesmo com muitos prostíbulos sendo permitidos pelos padres e abades locais, desde que pagando seus respectivos dízimos à Igreja e, obviamente, atuando na mais absoluta discrição.

Mesmo assim, esta Idade Média européia estava muito distante dos mundos de fantasia medieval encontrados nas mesas de jogadores de RPG mundo afora, obviamente que sem quaisquer dragões ou mortos vivos, fora no imaginário popular europeu, mas também com muitos poucos Paladinos honrados (nome dado aos cavaleiros de Carlos Magno) a procura de princesas virgens para salvar, tal como demonstrado nos famosos "Contos de Cavalaria" shakespearianos.

3 comentários:

Jacques disse...

Marco, porque não me disse que era tu, seu obtuso?
Eu pensei que fosse algum amigo qualquer do Domênico...
Já li alguns livros sobre a Idade Média e eles também disseram que não era tão exageradamente obtuso (he,he) assim esse período.
Mas foi essa a imagem que entrou pra História...
Segurar o celular com uma mão e colocá-lo na orelha do lado oposto?
Isso é novidade...
Até mais.

Marco Collares disse...

Pois é.
Obtusidades a parte, sou eu.

Drowmage disse...

Muito bom.

Acho que o único período histórico mais romantizado que a idade média européia é a japonesa, o pessoal realmente acha que os samurais eram um bando guerreiros super-poderosos e super-honrados.